Hoje não sou eu quem vai falar com vocês. Hoje, nós vamos conversar com a Pryscila.
A Pry é mãe do Matheus, um guri de 03 anos super especial, que foi diagnosticado, recentemente, como autista.
Então, vamos à nossa conversa, que é o que importa!
AASM: Oi,
Pryscila. Vamos começar apresentando você. Conte pra gente quantos anos você
tem, como conheceu seu esposo, quem são e quantos anos têm os seus filhos.
P: Olá,
tenho 33 anos. Conheci o Thiago na empresa que trabalhávamos juntos. Isso foi
em 2009 e nos casamos em 2011. Tenho dois filhos, o Gabriel (que tem 13 anos,
filho de outro relacionamento) e o Matheus (de 3 anos).
AASM:
Vamos falar um pouco de gravidez. Como foram as duas experiências de grávida? A
gravidez do Matheus foi diferente da gestação do seu filho mais velho?
P: A
gravidez do Gabriel foi bem turbulenta. Tive problemas com o pai dele, que, já
no inicio, não quis assumir o filho. Logo descobri que a placenta estava
deslocada e poderia perdê-lo a qualquer momento. A gestação inteira foi de
medicação e internação. Emagreci, no total, 10 Kg. Fiquei em depressão pois
muitas coisas ocorreram. Meu pai na uti por diversas vezes e eu morava com ele.
Mas no final deu tudo certo, Gabriel nasceu de parto normal pesando 4.900 kg e
medindo 51 cm.
A
gravidez do Matheus foi planejada. O Thiago queria ser pai e então decidimos
ter logo para que ele aproveitasse bastante. Meu esposo cresceu em abrigo, sem
contato com família, e ele queria viver isso. Ter essa experiência. Logo que
engravidei foi uma felicidade na família toda. Mas logo vieram os problemas.
Tenho Hematuria (sangue na urina), desde criança e, até hoje, não conseguimos
descobrir a causa. Com isso vieram as infecções de urina. Uma atrás da outra.
Tomei vários antibióticos diferentes. Quando completei 28 semanas de
gestação começaram as contrações. Meu obstetra resolveu me internar. Foram dois
dias de sufoco tentando segurar a gestação. Daí, mais medicações. Fiquei em
repouso absoluto, com monitoração 24 horas por dia. Além disso, descobrimos que
estava com Bigeminismo (arritmias cardíacas). Seria arriscado um parto normal.
Na 37° semana de gestação, as contrações voltaram e então decidimos fazer a cesária. Ele
nasceu com 3.180 kg, medindo 49 cm.
AASM:
Como foi o desenvolvimento do Matheus nos primeiros meses de vida?
P: Logo que ele nasceu já percebi que havia algo de
diferente nele. Não desgrudava de mim. Chorava o tempo todo e só se acalmava
comigo. Porém, seu desenvolvimento foi ótimo, perfeito. Foi crescendo
corretamente, se alimentando bem, os dentes vieram com 5 meses. Ele não
engatinhou e já andou com 9 meses. Com menos de 1 ano já sabia mexer no celular
e escolher seus próprios vídeos.
AASM:
Quando foi que vocês perceberam que havia algo diferente no Matheus?
P: Desde
o inicio achava ele diferente, mas não sabia explicar. Ele não ficava com
ninguém, de forma alguma. Até que fui na casa de uma amiga e ela me contou que
seu filho tinha sido diagnosticado autista. Então perguntei o que era autista e
ela me explicou. Saí da casa dela confusa demais, pois tudo que ela me dizia
era o Matheus.
AASM:
Como foi todo o processo de descobrimento de que Matheus é autista? Desde a
percepção de vocês até a confirmação de diagnóstico?
P: Ele andava
na ponta dos pés, rodava em volta de si mesmo e não caia. Gostava de olhar
fixamente para ventiladores. Gostava de tudo organizado, não suportava sujeira,
inclusive se sentir sujo. E o que mais me chamou a atenção foi que ele começou
a recusar contato com outras pessoas. Mas o irmão do Thiago, que conviveu com
ele no abrigo, dizia que ele era o pai todinho e que essas atitudes o Thiago
tinha quando criança. Então, deixei pra lá. Mas, quando resolvi colocar ele na
escola, com 1 ano e meio, ele recusou a escola de tal maneira que a diretora me
orientou a ficar com ele mais um ano em casa.
Nesse
período, pra mim, o Mattheus só demonstrava ser, cada vez mais, autista. Então
decidi colocar ele na escola de uma amiga que é diretora. Conversamos com ela e,
com 2 anos e meio, ele começou a creche. Teve seu período de adaptação mas nada
fora do normal. Mas, em junho de 2015, a professora dele me orientou a
leva-lo na fono. Ele não falava nada, nem papai e mamãe. Nada. A comunicação
dele era pegar na nossa mão e nos levar até o que ele queria.
Na
primeira consulta com a fono, ela descartou o autismo. Porém, no decorrer das
consultas, que era uma vez por semana, ela me chamou e pediu para que eu
procurasse um neuropediatra, pois ele tinha características de um autista,, mas
que precisava ser diagnosticado por um especialista.
A
consulta com o neuro foi bem estranha, rs. Ele não me deixava falar uma só
palavra. Ficava analisando o Matheus o tempo todo na frente de um espelho e
preenchendo um pedido de exame. Até que, no fim da consulta, ele perguntou se
eu tinha alguma dúvida e fiz a pergunta. A resposta foi "Qual a sua dúvida,
mãe?"
AASM:
Vocês tiveram que ir a muitos médicos até ter um diagnóstico final?
P: Ainda
estamos tentando um diagnóstico mais preciso. Trocamos de neuro, pois esse que
estávamos indo não respondia às minhas perguntas. Não acreditava em nada do que
eu falava. Pediu um laudo da escola. E quando falava de algum comportamento,
ele pedia vídeos. Receitou um antidepressivo que fez o Matheus dormir muito e
vomitar. Mas, quando eu falava dos efeitos do remédio, ele desconversava. A
consulta com o novo neuro é dia 01/02/16.
AASM:
Imagino que tenha sido um "baque" para você e seu esposo descobrirem
que Matheus é autista. Como foi e é a reação do irmão mais velho?
P: Na
verdade, não foi um baque. Foi um alivio. Parece estranho, né? Mas, olha pelo
meu lado: você tem um filho e sabe que ele é diferente de todas as crianças (eu
cuidei de 9 crianças antes dele). Ele não reage à outras crianças. Em um parque,
ele prefere brincar sozinho. Ele não gosta de festas. Gosta de tudo organizado
e ficava confuso demais... Ora queria dormir e, ao mesmo tempo, comer e brincar.
Enfim, era uma loucura aqui em casa. Ficava agressivo ao ponto de me bater, mas
não adiantava dar bronca. Isso piorava e ele ficava mais confuso. Quando queria
algo, era aquilo e pronto. Como se fosse birra e a gente tratava como birra.
Isso virava uma confusão imensa em casa.
Quando
descobrimos o autismo, tudo mudou. Agora entendemos mais ele. Por exemplo,
quando ele fica nervoso, ele me bate. Agora, ao invés de brigar ou colocar de
castigo, eu acalmo ele e depois explico que o que ele fez foi errado. Quando
fica confuso, tentamos acalmar ele até descobrir o que ele realmente
quer.
E agora
entendemos até o pai, que com a descoberta do autismo do Matheus, descobriu ser
autista.
AASM:
Matheus tem apenas 03 anos - ele faz algum tratamento médico? Alguma terapia?
P: Apenas
fono, por enquanto. Ele vai operar dia 20/02/16 da adenoide e, depois, vamos
procurar a terapia. Ele fez muitos exames e não queremos estressar ele.
AASM: Foi
muito difícil achar tratamento e orientação sobre autismo?
P: Na
verdade, uso redes sociais. Um amigo me passou o contato de uma assistente
social, mas devido a cirurgia do Matheus, adiamos a reunião. Tudo no seu tempo.
AASM:
Como é conviver com uma criança autista?
P: Uma
conquista a cada dia (Me fez chorar). Não dá pra definir.
Parei
minha vida. Não posso trabalhar pois ele não aceita outra pessoa cuidando dele.
Parei
minha vida social.
É saber
que seu dia será a mesma coisa, todos os dias, pois eles não gostam de trocar a
rotina. Isso confunde ele.
Mas nada
disso me desanima. Pelo contrário! Me sinto grata a Deus por me confiar a essa
tarefa. Durmo mais exausta do que qualquer outra mãe mas acordo sempre mais
feliz.
AASM:
Como você se sente, sendo mãe de uma criança diagnosticada como autista?
P:
Confusa e privilegiada. Não imaginava ser capaz de tanta coisa. Não imaginava
conhecer o amor por traz de uma síndrome. Isso me faz crescer a cada dia mais.
Matheus me ensina, todos os dias, a amar de formas diferentes.
AASM:
Qual a rotina do Matheus, hoje?
P: Ele
precisa saber que a família (pai, irmão e mãe) estão por perto. Sabe a hora que
o pai sai para trabalhar e chega. Brinca o tempo todo e assiste seus vídeos.
Gosta muito carinho e é carinhoso. Não gosta de mudanças na rotina.
Acorda,
toma seu leite, brinca. Mas não gosta de brincar com outras crianças. Gosta de sair,
passear. Adora música (isso o acalma muito). E ama animais.
AASM:
Você percebe algum preconceito das pessoas em relação a Matheus?
P: Apenas
uma vez. No hospital perto de casa, a enfermeira não queria me deixar entrar,
com o pai, para Matheus tomar a medicação. Quando a informei sobre o autismo
dele, ela fez cara de pouco caso e mesmo assim não me deixou entrar.
As
pessoas, quando ouvem eu dizer que ele é autista, perguntam se eu tenho certeza
pois ele não parece. Daí eu digo que o Messi é e também não parece. Isso parece
encantar, rsss.
AASM:
Matheus vai à creche? Se sim, foi muito difícil achar uma que aceitasse a
condição especial de Matheus?
P: Na
primeira creche ainda não tínhamos a certeza e foi complicado ele aceitar. Tivemos
que tirar. Na segunda, como já conhecia a diretora, foi mais fácil. Quando,
no decorrer do ano, descobrimos o autismo, ela se sentiu grata por saber que eu
não ia tirar ele de lá e aceitou o desafio como uma parceria. Foi muito bom.
Agora ele
vai pro XXX e, na matricula, me senti muito acolhida pela escola que também
aceitou a parceria.
* Retirei
o nome da escola para preservar a família
AASM:
Como você está hoje diante de toda esta situação?
P: De
verdade, me sinto confusa. O diagnóstico foi em setembro de 2015, recente.
Ainda não tive tempo de procurar uma terapia para mim. Preciso, para poder lidar
melhor com tudo isso. Não é fácil. Você quer sair com seu filho e não sabe se
ele vai ficar, ou não, no ambiente. Nunca sei a reação dele diante dos fatos.
Ele é indiferente e isso mexe muito comigo.
AASM:
Como está sua família, hoje? Seu relacionamento com seu esposo e seu filho e
deles com Matheus?
P: Meu filho Gabriel é um anjo. Me ajuda muitooooooooo, rs. Muito compreensivo e brinca demais com o irmão.
Minhas
irmãs e minha mãe me ajudam muito e hoje entendem algumas atitudes do Matheus (que
antes era considerado "chato").
Como mencionei,
acabamos descobrindo que o Thiago também tem características de autista e, por
isso, Matheus é tão parecido com ele. Isso fez eu entender ele um pouco também.
Estamos em parceria, juntos. Sempre estamos procurando ajudar um ao outro Acho
que fortaleceu nossa relação.
AASM:
Você acha que existe bastante informação sobre o autismo?
P:
Informações, sim. Mas, muitos desconhecem a verdadeira face do autista. Muitas
informações são desencontradas. Às vezes, leio um artigo e, quando leio outro,
me parece que as informações ficam divergentes.
AASM: O
que você espera da sociedade com relação a Matheus?
P: Não só
em relação a Matheus, mas acho que a sociedade, em um modo geral
precisa ter mais compreensão. Menos preconceito e mais atitude dos
governantes.
Eles são
muito inteligentes e só precisam de um estímulo a mais para se desenvolverem.
São anjos que mudam completamente nossa forma de amar ao próximo.
Me emocionei demais lendo essa entrevista. Parabéns Bia e Pry!
ResponderExcluirEu admiro demais vocês!
Beijos
Luciana